
A genética a favor da dermatologia personalizada: polimorfismos e o envelhecimento da pele
Com os avanços na medicina personalizada, a dermatologia tem acesso a novas ferramentas para entender e manipular os mecanismos que contribuem para o envelhecimento da pele. Um estudo recente publicado no Journal of Personalized Medicine, conduzido por pesquisadores lituanos, apresenta um modelo inovador que combina dados genéticos e exames laboratoriais de rotina. Este modelo visa mapear a suscetibilidade individual às mudanças funcionais da pele relacionadas à idade.
O envelhecimento cutâneo é um processo complexo que resulta de uma interação entre fatores intrínsecos, como genética e metabolismo, e fatores extrínsecos, incluindo exposição à radiação UV, poluição e estilo de vida. Embora pessoas da mesma faixa etária possam ter padrões de envelhecimento distintos, a genética desempenha um papel significativo nesse processo. A análise de polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs) relacionados a propriedades funcionais da pele, como capacidade antioxidante, elasticidade, hidratação e resposta inflamatória, emerge como uma ferramenta valiosa. Essa abordagem permite a identificação precoce de vulnerabilidades e a formulação de estratégias preventivas ou terapêuticas personalizadas.
O estudo lituano e seus achados
A pesquisa analisou 15 polimorfismos em genes relevantes, como SOD2, GPX1, CAT, IL1B, TNF-α, MMP1 e COL1A1, em uma amostra de 370 voluntários saudáveis. Os SNPs foram correlacionados com parâmetros de bioquímica sanguínea e hemograma, revelando que certas variantes genéticas se associam a alterações laboratoriais que podem impactar a saúde da pele.
Exemplos clínicos relevantes
Um dos polimorfismos estudados foi o gene CAT (rs1001179), que está relacionado à atividade da catalase e demonstrou uma correlação com a elevação dos níveis de AST (aspartato aminotransferase). Isso sugere um possível estresse oxidativo sistêmico, uma condição que pode favorecer a degradação das fibras dérmicas e o envelhecimento precoce da pele. Além disso, uma variante no gene GPX1 (rs1050450), responsável pela produção da glutationa peroxidase, mostrou estar correlacionada com alterações no perfil leucocitário, especialmente eosinófilos e linfócitos, bem como com elevações discretas de ALT (alanina aminotransferase) e GGT (gama-glutamil transferase). Essa alteração pode indicar uma inflamação crônica de baixo grau, contribuindo para o envelhecimento da matriz extracelular da pele.
Outro SNP relevante é o do gene IL1B (rs1143634), que afeta a expressão de uma citocina pró-inflamatória. Este polimorfismo demonstrou uma associação significativa com a elevação da amilase pancreática e da proteína C reativa (PCR), estabelecendo um elo entre a inflamação sistêmica e a integridade da pele, particularmente em indivíduos com pele sensível ou tendência a dermatites. Além disso, o polimorfismo no gene TNF-α (rs1800629), que está ligado a uma resposta imune exacerbada e à apoptose de melanócitos, apresentou correlações com o aumento de linfócitos, PCR e colesterol total. Essa variante pode impactar não apenas a pigmentação da pele, mas também predispor à flacidez dérmica e a alterações na barreira cutânea.
O SNP no gene MMP1 (rs1799750), que está associado à remodelação da matriz extracelular, demonstrou uma relação com níveis elevados de ALT e creatinina, sugerindo um estado de catabolismo tecidual acentuado. Clinicamente, isso pode se manifestar como formação precoce de rugas, perda de turgor e elasticidade da pele. Adicionalmente, polimorfismos nos genes ELN (rs7787362) e COL1A1 (rs1800012) foram correlacionados com a elasticidade e sustentação dérmica, onde os genótipos heterozigotos e minoritários apresentaram associações com alterações no perfil de basófilos e monócitos, além de marcadores hepáticos, refletindo uma capacidade reduzida de reparo estrutural da pele.
Por último, uma variante no gene AQP3 (rs17553719), que codifica uma aquaporina envolvida na hidratação cutânea, foi associada a alterações discretas nos níveis de cálcio iônico e potássio, indicando um impacto na homeostase hídrica e na função de barreira da epiderme.
Implicações clínicas e futuras direções
O estudo também destacou a ausência de associações significativas em indivíduos com genótipo selvagem (WT) para todos os SNPs analisados, sugerindo que a presença de alelos variantes (heterozigotos ou homozigotos minoritários) confere maior relevância clínica para a avaliação personalizada. Esses dados reforçam a viabilidade da integração da genotipagem em protocolos clínicos voltados para a avaliação do envelhecimento cutâneo, principalmente em consultórios de dermatologia, medicina estética e preventiva.
Associada a exames laboratoriais básicos, a análise genética pode orientar decisões clínicas, como a escolha de ativos antioxidantes ou anti-inflamatórios, a indicação de procedimentos regenerativos, como bioestimuladores e plasma rico em plaquetas, além de promover a adoção de medidas protetoras específicas para grupos de risco. O monitoramento longitudinal de pacientes com maior susceptibilidade genética também pode ser realizado.
Este estudo representa um passo significativo na translação do conhecimento genético para a prática clínica, propondo um modelo de avaliação individualizada baseado em dados objetivos e de fácil acesso. A utilização do perfil genético como um marcador preditivo do envelhecimento cutâneo abre novas possibilidades para intervenções precoces, eficazes e personalizadas, que são fundamentais na medicina de precisão.
Referência Bibliográfica
Sepetiene R, Patamsyte V, Valiukevicius P, Gecyte E, Skipskis V, Gecys D, Stanioniene Z, Barakauskas S. Genetical Signature-An Example of a Personalized Skin Aging Investigation with Possible Implementation in Clinical Practice. J Pers Med. 2023 Aug 25;13(9):1305. doi: 10.3390/jpm13091305. PMID: 37763073; PMCID: PMC10532532.
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