Estatinas e Apalutamida no Câncer de Próstata Avançado

Estatinas e Apalutamida: Efeitos no Câncer de Próstata Avançado

Estudos recentes têm explorado a relação entre o uso de estatinas e a terapia com apalutamida em homens com câncer de próstata avançado. Essas investigações sugerem que o uso de estatinas pode estar associado à redução da mortalidade, mas é essencial interpretar esses dados com cautela.

No cotidiano clínico, muitos homens diagnosticados com câncer de próstata avançado apresentam não apenas a história oncológica, mas também um contexto cardiovascular que merece atenção. A intensificação do bloqueio androgênico, especialmente com inibidores do receptor androgênico, como a apalutamida, pode melhorar os resultados oncológicos, mas também aumentar o risco de complicações cardiometabólicas. Uma questão importante que surge é se o uso concomitante de estatinas, frequentemente prescritas para a prevenção de eventos cardiovasculares, está associado a uma melhor sobrevida global (OS) e quais os custos em termos de eventos cardíacos.

Desenho Metodológico do Estudo

O estudo de Roy e colaboradores é uma análise de coorte pós-hoc que utiliza dados de dois ensaios clínicos de fase 3: o SPARTAN (realizado de outubro de 2013 a dezembro de 2016) e o TITAN (de dezembro de 2015 a julho de 2017). Ambos os estudos incluíram pacientes que receberam tratamento com apalutamida ou placebo, e a exposição de interesse foi o uso de estatinas durante o período do tratamento. Os desfechos principais analisados foram a sobrevida global e a ocorrência de eventos cardíacos graves (grau ≥3).

Os autores utilizaram modelos de Cox multivariados para estimar a OS, ajustando para variáveis como idade, índice de massa corporal (IMC), estado funcional (ECOG), escore de Gleason, comorbidades como diabetes e hipertensão, entre outras. A análise incluiu 2187 pacientes, sendo 1288 tratados com apalutamida e 900 com placebo. As medianas de idade foram de 65 anos no TITAN e 70 anos no SPARTAN, refletindo uma população que, além do câncer, possui várias comorbidades cardiovasculares relevantes.

Resultados e Discussão

A análise dos dados revelou que, entre os pacientes tratados com apalutamida, o uso de estatinas estava associado a uma melhor sobrevida global. Os resultados mostraram um hazard ratio (HR) de 0,53 (IC 95% 0,32-0,87) para o TITAN e 0,54 (IC 95% 0,39-0,74) para o SPARTAN. Em contrapartida, entre os pacientes que usaram placebo, não foi observada uma associação consistente, com HR de 0,65 (IC 95% 0,38-1,13) no TITAN e 1,16 (IC 95% 0,76-1,77) no SPARTAN.

As probabilidades ajustadas de sobrevida aos três anos mostraram que, no TITAN, 81% dos pacientes tratados com apalutamida e que usavam estatinas estavam vivos, comparados a 67% daqueles que não estavam em uso de estatinas. No SPARTAN, esses números foram de 86% versus 78%, respectivamente. Esses dados sugerem que o benefício observado está mais relacionado ao uso de estatinas em combinação com a terapia androgênica intensificada, indicando uma possível modulação das vias de crescimento tumoral.

No entanto, o estudo também identificou um aumento no risco de eventos cardíacos graves entre os usuários de estatinas, com HR de 2,62 (IC 95% 1,35-5,08) no grupo da apalutamida e 2,36 (IC 95% 0,96-5,84) no grupo placebo. Os autores levantaram a hipótese de que esse aumento possa estar ligado à maior carga de comorbidades cardiovasculares entre os pacientes que utilizam estatinas, além de um possível viés de indicação, onde as estatinas são prescritas como uma medida preventiva para pacientes com maior risco cardiovascular.

Implicações Clínicas

As conclusões do estudo devem ser interpretadas com cautela. É importante ressaltar que o uso de estatinas não deve ser iniciado unicamente com a intenção de tratar o câncer, mas se houver uma indicação cardiovascular, a manutenção do uso é recomendada. A integração da cardio-oncologia desde o início do tratamento é crucial, permitindo uma melhor estratificação do risco cardiovascular dos pacientes sob tratamento com apalutamida.

Além disso, é fundamental monitorar possíveis interações entre a apalutamida e estatinas, especialmente em pacientes que utilizam estatinas de alta potência. A comunicação clara com os pacientes sobre os achados do estudo e suas implicações é essencial para evitar abandonos desnecessários de estatinas por medo de efeitos adversos.

Por fim, o raciocínio clínico deve ser adaptado para cada paciente, avaliando a necessidade de manter ou iniciar o uso de estatinas com base no perfil lipídico e na presença de fatores de risco cardiovascular, sempre documentando as conversas sobre os potenciais benefícios, mesmo que incertos, relacionados ao tratamento oncológico.

Considerações Finais

Em resumo, para homens com câncer de próstata avançado em tratamento com apalutamida, o uso concomitante de estatinas parece estar associado a uma melhor sobrevida global. No entanto, também existe um aumento na incidência de eventos cardíacos graves, o que ressalta a importância de uma abordagem cuidadosa e integrada entre as especialidades de oncologia e cardiologia.

Estudos futuros são necessários para validar essas associações e esclarecer as direções causais entre o uso de estatinas e os desfechos oncológicos e cardiovasculares.


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